domingo, 7 de junho de 2015

Tudo Está à Venda

(Inspirado e dedicado à uma galera que me fez sair de mim e me fez sentir assim, pulsante. Obrigada Grupo Tripé pelo seu Novo Espetáculo.)

Uma inquietação que sobe por cima e desce escorrendo pelos dedos soltos. Pessoa solta. É tudo de verdade, mas se você acreditar pode virar representação, pode virar outra coisa, pode virar inquietação. Tudo de novo e voltamos ao começo e voltamos no desejo de dizer o que nos chama. O sangue pulsa nas veias e passeia pelo meu ser me tornando cada vez mais insaciável e tomado pelas palavras que não se calam e não me deixam dormir. Eu nem sei se quero mesmo dormir, não se quero me render à ilusão que é estar sujeito a ver o que minha mente planeja dentro de si. Mas as palavras me deixam cada vez mais sujeito. Eu só quero sair, só quero brincar, só quero tirar a roupa e dançar na chuva, quero pular corda e beijar um estranho. Me leva nessa viagem porque aqui eu não quero ficar. Não quero mais esse lugar quieto, dormente, sereno. Quero as noites frias e o descontentamento com o amanhecer. Eu quero que o dia dure uma semana e que essa semana seja o meu fim. Eu quero despertar. Quero seguir o pulso latente que me percorre por dentro e me tira da cama todas as manhãs que estou fadado a não reagir. Quero a brincadeira de me vestir diferente e reagir consciente ao poder que guardo aqui dentro. A gente sabe que o possui. Mas a gente não usa, a gente se acostuma e não revida quando leva porrada na cara. A gente vira as costas. Tá na hora de dar o murro. É nossa rodada no jogo. Nosso desejo. O povo. Outro dia eu presenciei uma fala que não acreditei, não consegui entender como aquela frase havia saído da boca de uma pessoa que eu julgava consciente das coisas. A luta deve vir de dentro, deve começar no peito e desabrochar até o pé, que finca no chão e não se arreda até conseguir. Vamos agora dançar e celebrar a alegria de estar aqui. Vamos pulsar junto dessa bateria. Vamos celebrar a alegria da luta e a força conjunta que nos cabe aguentar. Vamos alegrar que a batalha há de se findar para, enfim, podermos sentar. É tudo de verdade, mas se você acreditar pode virar relação, pode virar outra coisa, pode virar revolução.

terça-feira, 26 de maio de 2015

Aberração Cromática

(Estudo de personagem.)

Eu queria te contar uma história. [Não sei bem se devia ou se queria mesmo]. Ela começa outro dia, quando acordei de madrugada perturbada pelos meus sonhos. Acordei e não consegui mais voltar a dormir. Eu precisava pintar. Eu precisava colocar pra fora algo que se entalava e se escondia no meu peito, no meu sujeito singular e incomposto. O meu verbo é intransitivo e eu não consigo complementar. Eu tenho sede de me descobrir mas eu nem sequer sei acordar pra saber se de fato estou viva.

Olhei pela janela e só vi a escuridão. |Fechei| Eu não precisava de mais escuridão. Eu quero o claro, a claridade, a certeza, ou a incerteza mesmo. Mas a consciência. 

Branco. Quero tudo branco.

Não sai. Não sai. Nada sai!

Eu estou me sentindo imobilizada.

É como se eu fosse sendo amarrada por cada traço que eu não consigo dar, cada pincelada que eu hesito em performar.

Isso tem que acabar.

quarta-feira, 20 de maio de 2015

Sujeito

(Esse vai pras pessoas mais lindas que encontro toda segunda e quarta. "Porque o que a gente faz é amor." BAGGIO, Danielle.)

A presença é a única que acalma
É a única que preenche
A única que me aquece

A saudade é a que dói
É a que lá do fundo me faz lembrar
Que um dia você esteve aqui

Eu aprendi
Que não é só se falando
Que a gente vai se encontrar

Aprendi
Que a gente tem que olhar nos olhos
Pra poder confiar

Eu entendi
Que é só se tocando
Que se sente

Entendi
Que é só vivendo
Que se entende

sábado, 18 de abril de 2015

Sobre muita coisa, e quase nada.

A gente espera do mundo e ele nada nos dá em troca. O pior, é que não é nem do mundo que a gente espera. Não é culpa dele, não vou culpá-lo por nossas falhas, por falhas humanas. Ou melhor, des-humanas. Não vou colocá-lo numa posição quando ela, em mim, é ocupada por pessoas. O mundo é mais. O que somos nós comparado com isso tudo? Nós, humanos, que de humanos pouco temos, convenhamos. Na verdade, acho que somos muito humanos e isso faz com que tenhamos atitudes muito humanas e que, mal interpretadas, são vistas como des-humanas. Talvez não é nem que elas sejam mal interpretadas, mas acabamos as vendo como des-humanas. A verdade é que é tudo muito subjetivo para se tentar tirar alguma conclusão concreta e lógica. Mas não vim falar disso. Eu falava da espera, de se esperar. Acabei falando um pedaço de uma letra de uma música que me veio na cabeça mas que agora não me recordo o nome, ou o resto da letra, e disso puxei o fio da meada. A bem da verdade eu falava da minha espera. Eu estava esperando ou queria esperar ou esperava esperar. Não sei exatamente o quê ou se quer o por quê, mas esperava. A gente, ou eu, sempre espera alguma coisa. Acho que sempre se está à espera de algo. Não é bem aquela espera literal de se sentar em uma poltrona e aguardar madrugada a dentro a volta de quem você sabe que vai demorar ou de quem você fica imaginando se vai realmente voltar. É aquela espera mais figurativa, em que se deseja que algo aconteça, logo se espera que o tal algo aconteça. É a espera nesse sentido, por isso é uma espera, um aguardo, um anseio quase. Suspiro. É impressionante como as pessoas podem nos desapontar. E talvez nem seja porque elas queiram, talvez elas nem saibam. Acho que muito provavelmente elas realmente não saibam. Mas como criamos expectativas, as pessoas acabam nos desapontando sem nem sequer saber que o fizeram. Ficamos magoados e as pessoas nem sabem o porquê. A gente é meio engraçado. Mas não é a graça literal de se ter graça, fazer palhaçada, dar gargalhada, rir ou coisa do tipo. É a graça figurativa, que não se sabe bem explicar mas se usa como expressão, a graça como algo de curioso num fato. Por exemplo, engraçado como nós, humanos, nos apegamos a coisas do nosso cotidiano, a pessoas que mal conhecemos, etc. Ou então, engraçado quando tentamos nos fazer entender explicando algo mais e mais e acabamos por confundir a quem se está explicando o tal algo. Meu Deus, como falar de maneira genérica é confuso, acho que até acabo me perdendo na linha de pensamento. Mas tá aí uma coisa, Deus. Difícil discutir sobre Deus. Cada um com sua visão, seu entendimento, sua crença. Não vou nem entrar nesse mérito. Mas a nossa cultura é tão marcada pela fé do povo, que expressões como "Deus me livre" são comuns até a ateus. Engraçado.

Eu nunca fui muito boa com nomes. Ou números. Ou endereços. Ou caminhos. Ou lembranças. A verdade é que minha memória (ou mesmo minha cabeça) é uma coisa meio louca. Não tem muita hora, é meio de lua, lembra do que gosta e do que que quer, ou (às vezes) do que precisa.

Passei a minha vida inteira em um apartamento só. Eu nem nunca mudei de quarto. Conheço cada cantinho, cada tábua que faz barulho (para não pisar à noite), cada porta que range, o quanto cada janela pesa para abrir. Vivi muitas coisas nesse um apartamento. Me lembrava do meu pai quando voltava dos fins de semana que passava com ele, tive um cachorro que com poucos anos faleceu, discuti inúmeras vezes com minha mãe e meu irmão, caí, me machuquei, arranquei meus dentes, andei de skate, de patins (sim, dentro do apartamento), viajei a lugares incríveis assistindo filmes e lendo livros, descansei ao voltar de viagens, escondi objetos pessoais, fiz bagunça, arrumei, conversei sozinha em tudo quanto foi momento e, acima de tudo, já me apaixonei e desapaixonei diversas vezes enquanto morei nele. Se as paredes desse apartamento pudessem falar, contariam toda a minha história, provavelmente até melhor do que eu. Só elas sabem exatamente tudo o que eu passei enquanto morei nele. Só elas saberiam me descrever como ninguém, só elas me entendem, só elas. Só elas sabem o que eu aprontei dentro daquele lugar. O apartamento em si me deu vida. Cresci lá. Mas mais do que isso, o meu quarto. Que desde o princípio foi meu. Antes eu até o dividia com meu irmão, mas chegou um dia que ele teve de sair. Era meu. Só meu. Agora, se as paredes daquele quarto pudessem falar... a história seria muita mais divertida, intensa e emocionante. Se algum lugar me conhece naquele antigo lugar, é aquele quarto. Vou sentir falta das tábuas que rangiam ao se pisar, que depois fui aprendendo a dosar o peso e não fazer barulho. Vou sentir falta das portas dos armários que enchi com adesivos. Vou sentir falta das paredes que por diversos dias e noites me escutaram rir, chorar, xingar, desabafar, me expressar. Mas mais do que tudo isso, eu agradeço por estar me despedindo. Esse dia ia chegar e que bom que ele veio em paz, veio calmo e sereno e eu pude parar para refletir. Era exatamente disso que eu estava precisando para definitivamente mudar a minha vida. A pessoa que eu era e a pessoa que eu quero ser daqui pra frente. Era mais disso que eu estava precisando do que qualquer outra mudança que já aconteceu. Só mais essa, pra eternizar.

Eu acho engraçado quando paro pra pensar no que me apego. Um apartamento. Coisa mais esquisita para se apegar. Mas não sei, talvez seja mais do que isso, mais do que apenas um apartamento. São vinte anos. São toda a minha vida.

Mas também não são quase nada.

domingo, 12 de abril de 2015

O que não termina quando acaba.

Pinga a gota
Cai a chuva
Conta a gota
E chove o dia
Escorre
Esconde
E pia
Pia
Torneira vazia
Pingando
Dezembro
O dia
Dizia
Seria
Você
Quem viria
À noite
Vazia
Vagando
Sonhando
Lembrando
Me contando
Que seria
Gota a gota
Que se enchia
Uma lágrima

sexta-feira, 3 de abril de 2015

a caso

(algum)as falas me chamam
(algum)as palavras me encantam
(algum)as distâncias me proíbem
(algum)as horas não saciam

os dias passam e eu preciso
o rosto vai ficando nublado
o cheiro cada vez mais distante
o sorriso, apagado

(algum)as risadas me coram
(algum)as tiradas me disfarçam
(algum)as trocas me engrandessem
(algum)as coisas apenas existem

os olhares vão se demorando
a espera vai me consumindo
de longe me ouço chorando
o que não passa, agora, é o ano

domingo, 8 de março de 2015

Soneto Desafinado

Bateu a cabeça na parede
Acordou expressionista
Se julgou equilibrista
Por balancear a vida no ar

O sol lhe raiou quadrado
A comida desceu a seco
O dia ficou vermelho
Anoitecendo quente, preto, verde

Ela se perguntou se a vida é só isso
Se ao invés disso
Não se pode ter sorriso

Queria se perder
No abismo
De ser dois

quinta-feira, 5 de março de 2015

Ouvi dizer que escrever sobre as vontades ajuda

Eu queria escrever. Eu queria escrever palavras bonitas. Eu queria escrever poemas e histórias incríveis que deixariam as pessoas boquiabertas. Eu queria escrever e encantar os leitores com minha destreza com as palavras. Eu queria escrever e descrever os detalhes sobre um dia ou uma vida ou um ano. Eu queria escrever sobre aquele dia. Eu queria escrever e recordar e guardar as memórias nas minhas palavras. Eu queria escrever e queria te dizer para me encontrar naquele lugar. Eu queria escrever e queria te ver pra gente se dizer o que nem escrito pode ser. Eu queria escrever e me acabar de chorar. Eu queria escrever e emocionar as pessoas. Eu queria escrever e fazer as pessoas morrerem de rir ou de chorar. Eu queria escrever e provavelmente queria que as pessoas chorassem. Eu queria escrever e fazer as pessoas entenderem a minha dor. Eu queria escrever e queria mostrar e escancarar as minhas entranhas para que os outros me vissem. Eu queria escrever contos mirabolantes e viagens épicas ao fim do mundo. Eu queria escrever do amor mais verdadeiro e da paixão mais fulminante. Eu queria escrever da morte mais morrida e da vida mais vivida. Eu queria escrever sobre o mendigo que outro dia me pediu esmola no sinal. Eu queria escrever sobre seres fantásticos e seus mundos. Eu queria escrever sobre pessoas. Eu queria escrever e marcar as pessoas. Eu queria escrever e queria que minhas frases ecoassem pelo tempo. Eu queria escrever para poder deixar minha marca na história. Eu queria escrever para lembrar e para lembrarem de mim. Eu queria escrever por medo de esquecer. Eu queria escrever para não me esquecerem e não me deixarem de lado. Eu queria escrever para que me vissem sem me ver. Eu queria apenas escrever.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Ao Som dos Bandolins

De choro me desfiz e te refiz. No palco, a atriz se diz meretriz, mas só condiz dizer que o que se sabe é pouco. E o toco, reforço, lá fora, te espera pra sentar e se acalmar, acalentar e se deixar pelo luar. Mas não tem lua, lá fora chove e a água leva embora as impurezas, as indefesas, as destrezas e nos convida a aproveitar. A dançar nessa água sagrada que nos banha do céu, nos cobre de algo parecido com mel. Só me diz se é real ou se é melhor deixar de lado, o que era o contrário do inverso do avesso do desigual que se julga anormal pelo jeito ideal de se dançar assim, ao som dos bandolins. Mas se ela apertasse desse jeito, ao som dos bandolins, me diz se seria direito que se cantasse e se rodasse como criança menina de saia na rua, de noite insegura, com jeito se apura e de longe se culpa e desculpa se soei mal. É que a madrugada me pegou de jeito e se desenvolveu ao som dos bandolins e me fez assim, como uma criança dançando a noite e valsando até o fim, pra se dizer feliz afim de me julgar amada ao som dos bandolins.

(16/12/2014)

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Indigestão

Do vício
Ao verso
Do reverso
Ao inverso
Do avesso
Ao contrário
Do acesso
Ao literário

Do disposto temporário que fosse junto, honorário
Confesso que o traço me pegou pelo contrário
Reverso avesso indigesto
Manifesto

Eu peço
Despeço
Tropeço
Arremesso
Mas de resto
Só, sem acesso.